Fonte e creditos da matéria Gazeta do Povo do Paraná.
Polícia Civil apura hoje 741
suspeitas de crimes contra a administração pública no Paraná e o Ministério
Público, 695. Se a PEC 37 for aprovada, MP deixará de investigar
GUILHERME VOITCH
Cerca de metade das investigações
sobre crimes contra a administração pública no Paraná está sendo conduzida pelo
Ministério Público Estadual (MP), sem a participação da Polícia Civil. Ou seja:
caso a Proposta de Emenda Constitucional n.º 37 (PEC 37) seja aprovada pelo
Congresso, a capacidade do estado de apurar suspeitas de irregularidades será
reduzida sensivelmente – a não ser que haja um reforço na atuação policial. A
PEC 37 proíbe o MP de fazer investigações criminais e delega essa atribuição
exclusivamente à polícia.
Levantamento da Gazeta do Povo
mostra que o MP promove atualmente 695 procedimentos investigatórios contra
crimes como peculato (apropriação de bens públicos), concussão (usar o cargo
público para exigir vantagens), corrupção ativa, corrupção passiva e prevaricação
(quando o agente público não cumpre suas obrigações legais). Nenhuma dessas
investigações conta com participação da polícia.
Já a Polícia Civil tem hoje 721
inquéritos policiais em andamento que tratam dos mesmos delitos. Portanto, das
1.416 investigações de crimes contra a administração pública conduzidas na
esfera estadual, 49% são feitas pelo MP e 51% por policiais.
Se aprovada, a PEC 37 poderia
criar um vácuo jurídico para as investigações do MP em andamento. “Seria um
retrocesso muito grande. Nem consigo imaginar”, diz o corregedor-geral do MP no
Paraná, Moacir Gonçalves Nogueira Neto.
Outros crimes
Além dos crimes contra a
administração pública, o MP ainda investiga 47 casos relacionados ao crime
organizado, 626 crimes praticados contra a ordem econômica e 131 casos ligados
ao controle externo da Polícia Civil. Com a aprovação da PEC, todos esses casos
também não poderiam mais ser apurados pelo Ministério Público.
O MP ainda informou à Gazeta do
Povo que, desde 2010, 667 investigações conduzidas pelo órgão tornaram-se
denúncias à Justiça, sendo que 339 dessas estão relacionadas aos crimes contra
a administração pública. Já entre os inquéritos conduzidos pela Polícia Civil,
141 viraram denúncia, desde agosto do ano passado.
Rito
A Constituição e o Código Penal
estabelecem um rito para as investigações. A autoridade policial é responsável
pelo inquérito policial, a fase de averiguação do crime. O promotor pode
requerer diligências e interrogatórios, mas fica à espera da definição do
trabalho policial. Concluído o inquérito, o promotor aceita a denúncia ou a
rejeita, arquivando o processo.
O procedimento investigatório,
nesse sentido, seria uma exceção para o MP. “Não queremos competir com a
polícia. Eles são nossos parceiros e responsáveis pelo inquérito policial.
Atuamos em casos mais específicos. Temos uma autonomia que o policial não tem”,
diz Nogueira Neto.
O delegado-chefe do Núcleo de
Repressão a Crimes Econômicos (Nurce), Cassiano Aufiero, tem outra visão.
“Tenho total liberdade e autonomia do meu delegado-geral para investigar a
situação que for”, diz.
O Nurce é a unidade especializada
da Polícia Civil do Paraná para atuar em casos de crimes financeiros e
corrupção. Aufiero, que conta com dois delegados-adjuntos e uma equipe de cerca
de 20 pessoas – entre investigadores e escrivães –, trabalha em cerca de 300
inquéritos atualmente. “Todos os distritos podem investigar, em teoria. Mas os
casos mais complicados são enviados para cá”, explica.
Juristas se dividem sobre o
assunto
A competência do MP para realizar
investigações não é unanimidade entre juristas. Para o advogado Thiago Bottino,
coordenador do curso de Direito da FGV no Rio de Janeiro, os limites à atuação
do MP estão definidos na Constituição. “Os procedimentos investigatórios [do
MP] não têm base na lei”, diz. Para ele, no entanto, a PEC 37 mais confunde do
que ajuda. Ele acha que o MP pode fazer algumas investigações para cumprir uma
de suas funções legais, que é o controle externo da polícia. “Nos demais casos,
acho um equívoco.” Bottino vê ainda impedimentos éticos nas investigações do
MP. “O advogado que considere a atuação de um delegado excessiva pode ir bater
na porta do promotor que, até o momento, é neutro. Se é o promotor que está
investigando, perde-se esse elemento.”
Professor do UniCuritiba e
ex-diretor-geral do Departamento Penitenciário Nacional do Ministério da
Justiça, Mauricio Kuehne é favorável ao poder de investigação do MP,
especialmente nos casos de corrupção. “O MP se adiantou e formou grupos
especializados para casos de corrupção e lavagem de dinheiro. A polícia não
acompanhou.” Mas Kuehne ressalta que o delegado é o titular da ação penal e
assim dever ser na maioria dos casos. Para ele, deve haver uma cooperação entre
delegado e promotor durante o inquérito policial. “O delegado conduz o
processo. O promotor tem suas dúvidas. Pode requerer uma série de elementos ao
delegado, até no sentido de formular algo que diverge da linha da investigação
policial.”